Professores de escolas públicas e privadas
afirmaram nesta terça-feira (5) que a prova do Exame Nacional do Ensino Médio
(Enem) deste ano está mais enxuta, com menos textos de apoio, mais conteudista
e com temas diferentes de anos anteriores. Ouvidos pela Agência Brasil,
eles disseram que as primeiras provas do Enem 2019 dão indícios de como serão
as provas nos próximos anos.
Neste domingo (3), 3,9
milhões de estudantes resolveram, em todo o país, questões de
linguagens e ciências humanas e fizeram a redação. No próximo domingo (10),
serão feitas as provas de matemática e ciências da natureza.
"Ficou claro que, sim, esta é uma prova
diferente agora. Então, a estatística que tínhamos antes, de assuntos mais
cobrados, possivelmente vai ser revista", disse o professor de história
Evandro Santana, da Escola Gisela Salloker Fayet, em Domingos Martins, Espírito
Santo.
A Gisela Salloker Fayet está entre as escolas
públicas que atendem alunos de baixo nível socioeconômico e
se destacam no Enem. As instituições foram identificadas no estudo
Excelência com Equidade no Ensino Médio: A Dificuldade das Redes de Ensino para
Dar um Suporte Efetivo às Escolas.
Neste ano, todos os estudantes da escola de
Domingos Martins inscreveram-se no Enem. "O Enem tem uma importância quase
central no ensino médio", ressaltou o professor Santana, que fez um
levantamento dos temas mais abordados em história desde o Enem 2013.
"Sabia que regime militar e Era Vargas [período em que Getúlio Vargas
governou o Brasil] eram questões certas todos os anos. Este ano não caiu nada.
Os conteúdos cobrados também foram surpresa."
O professor Aurélio de Menezes, que leciona
história, sociologia e direitos humanos na Escola de Referência em Ensino Médio
de Salgueiro, município com cerca de 60 mil habitantes, no sertão de
Pernambuco, também percebeu as mudanças. "Teve mais de uma questão de
Idade Média, quando tinha a [história] moderna e a contemporânea toda para
serem cobradas. Cada vez mais, os assuntos históricos têm sido ensinados em
diálogo com o presente, com a contemporaneidade", destacou. A escola
pública de Salgueiro também é um dos destaques no Excelência com
Equidade.
Os dois professores relataram, porém, as
dificuldades que os estudantes tiveram no exame, sobretudo com o tema da
redação, que neste ano foi Democratização
do Acesso ao Cinema no Brasil.
"O tema da redação foi muito bom",
afirmou Menezes, que ressaltou: "para quem tem um repertório de assuntos
acumulados, seria tranquilo, mas tratando-se da realidade brasileira –
sobretudo com a concentração de salas de cinema em médias e grandes cidades e
com plataformas de streaming [tecnologia de transmissão de
conteúdo online] pagas, como a Netflix –, ainda temos um certo elitismo
pela concentração de renda, ainda não é disseminado."
Menezes lembra que Salgueiro já teve um
cinema "há três, quatro décadas. Hoje não temos mais cinema". A
escola havia promovido, logo antes do Enem, no entanto, um seminário sobre
cinema. "Isso facilitou", disse o professor.
Estrutura mantida
Para o professor de história do Colégio Mopi,
no Rio de Janeiro, Alexandre Chada, a prova manteve sua estrutura, mas ficou
mais conteudista. “As questões conteudistas não exigem nenhum tipo de
habilidade que o aluno vai usar na universidade. É meramente decorar
conteúdos”, explicou Chada. "Mostrar habilidade de raciocínio, de
reflexão, comparar situações, fazer relações entre conteúdo de história e
atualidades, isso tem que ser mais explorado na prova”, afirmou o
professor.
Ele também sentiu falta de conteúdos de
história moderna e contemporânea. “A gente prepara os estudantes para temas
contemporâneos e eles fazem a prova e não cobram regime militar, nem Era
Vargas, que são fundamentais para o entendimento do Brasil de hoje”, destacou Chada.
“Os alunos se decepcionaram porque o Enem pegou mais matéria antiga e nada
atualizado.”
Para o professor de geografia Luiz Cláudio
Espírito Santo, da mesma escola, o conteúdo de geografia cobrado na prova ficou
dentro do esperado, mas as questões estavam mais fáceis do que em edições
anteriores. “Os enunciados foram mais simples, e as opções de resposta, mais
enxutas e literais, [exigindo] menos capacidade analítica e interpretativa, o
que acaba empobrecendo a questão.”
De acordo com Espírito Santo, desde 2017, a
prova de humanidades segue uma tendência de cobrar mais conteúdos e menos
interpretação, com menos charges, gráficos ou mapas. Em sua opinião, neste
ano, uma prova mais fácil "pode nivelar por baixo a seleção do próprio
concurso”.
Análise das questões
Chada destacou que, no Enem deste ano, uma
questão de ciências humanas lembrava uma que foi cobrada na edição de 2011: a
questão 92 do caderno branco, que teve o mesmo enunciado da 19 do caderno
branco daquele ano. “São excluídos de votar nas assembleias paroquiais”. As
questões são baseadas na Constituição Brasileira de 1824.
As questões são desenvolvidas, no entanto, de
forma diferente. A questão de oito anos atrás apresentava três situações de não
votantes, e os estudantes tinham que assinalar a opção com o objetivo de
garantir o direito de voto. Já a questão deste ano mostra cinco situações e
pede características do sistema eleitoral daquela época. “As questões são
diferentes, não cabe anulação”, enfatizou Chada.
O professor elogiou a questão que trata de
discriminação contra religiões de matrizes africanas, a 51 do caderno branco. O
texto de apoio mostra que 57% das agressões ocorrem em locais públicos,
geralmente próximos às casas de culto dessas religiões. “É muito importante
sempre no vestibular discutir isso.”
Luiz Cláudio Espírito Santo destacou a
questão 49 do caderno branco, que tratava de economia quilombola. O enunciado
trazia dados das comunidades de Mumbuca, em Minas Gerais, que ajuda no
abastecimento do município de Jequitinhonha, e de Campinho da Independência, no
Rio de Janeiro, que produz artesanato e mantém um restaurante para atender
turistas. “Achei a questão bem elaborada, foi um destaque positivo.”
Fonte: Agência Brasil
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