O presidente Jair Bolsonaro e o ministro da
Economia, Paulo Guedes, propõem ao Congresso Nacional um pacote de medidas
econômicas que pretende alterar o percentual de gastos constitucionais com
saúde e educação, reduzir salários de novos servidores públicos, mudar as
regras de ascensão funcional e reduzir jornadas e vencimentos dos trabalhadores
de governos e prefeituras que estiverem com restrições orçamentárias. O duro
pacote de viés liberal é mais uma tentativa de dar uma resposta tanta à crise
fiscal quanto às críticas de que o Governo Bolsonaro pouco tem feito
na área econômica desde que enviou a proposta de emenda constitucional da reforma
da Previdência, aprovada no mês passado depois de oito meses de tramitação.
Nesta terça-feira, Bolsonaro e Guedes estiveram
no Senado onde entregaram ao presidente da Casa, Davi Alcolumbre, três
propostas de emendas constitucionais que fazem parte de um pacto federativo. Em
uma das propostas, a União se compromete repassar ao menos 400 bilhões de reais
aos Estados e Municípios pelos próximos 15 anos. Em outra, cria uma espécie de
plano emergencial que altera regras temporárias e permanentes para unidades da
federação que estejam endividadas. E a terceira altera os limites
constitucionais de gastos sociais, como saúde e educação. Essa última medida já
enfrenta resistência desde o início porque pretende incluir nos gastos sociais
os pagamentos de aposentados e pensionistas. "A gente vai ter muita
dificuldade. Incluir inativo dentro da despesa social é um risco muito grande
de reduzir o percentual de gasto na área social", queixou-se o presidente
da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Horas depois, na coletiva de imprensa para
detalhar o projeto, os representantes do ministério já anteciparam que há um
acordo para retirar os inativos da conta, num primeiro sinal da resistência ao
megapacote.
Na quarta-feira, a previsão é que o Governo
entregue a reforma administrativa, a quarta PEC do pacote que trata da redução
salário dos novos servidores públicos, entre outros pontos. Ao discursar na
cerimônia de entrega do pacote, o presidente Bolsonaro disse esperar que todas
estejam aprovadas no primeiro semestre de 2020. "Temos certeza de que em
pouco tempo, talvez no início do ano que vem, talvez meados do ano que vem no
máximo, essa proposta se tornará uma realidade", afirmou o presidente.
As propostas
No pacote de elaborado pelo ministro Paulo
Guedes há quatro propostas de emendas constitucional (PECs) e dois
projetos de lei (PLs). Uma das propostas mais relevantes é que foi batizada de
PEC da Emergência Fiscal. Ela define dez gatilhos que podem ser
disparados sempre que os governos federal e dos Estados ultrapassarem os
limites de seu endividamento. Ela teria medidas temporárias e outras
permanentes. Entre as com prazo pré-determinado de até dois anos estaria uma
autorização para reduzir o salário de servidores juntamente com sua carga
horária, caso as contas públicas não fechem. Enquanto que entre as permanentes
a proibição de aumentos salariais para qualquer categoria nos últimos 180 dias
de mandato de prefeitos, governadores e do presidente da República.
As PECs são medidas que demandam maior quórum
para aprovação, ao menos três quintos dos parlamentares de cada casa (49
senadores e 308 deputados). Enquanto que os PLs demandam apenas a maioria
simples dos presentes. A expectativa de técnicos da Economia é que essa
proposta seja aprovada ainda neste ano, como uma estratégia para aprovar outras
duas PECs, a da Reforma Administrativa e a que está sendo chamada de Mais
Brasil. A primeira tem como objetivo enxugar a máquina, com redução salarial de
novos funcionários públicos, que terão de comprovar experiência prévia na
função, além de drásticas mudanças nas carreiras, como dificuldades para a
ascensão na carreira. Enquanto que a segunda PEC tratará da descentralização
dos recursos do pré-sal e da criação de um novo limite mínimo de gastos com
educação e saúde para Estados, União e Municípios. Hoje, cada uma dessas áreas
tem o seu limite predeterminado individualmente. A sugestão é que elas sejam
somadas. Por exemplo, se hoje gasta-se obrigatoriamente 25% do orçamento com
educação e 15% com saúde, a partir de sua aprovação o governante teria 40% para
investir nas duas pastas, da forma que melhor entendesse.
Uma inovação do Governo é a criação do
Conselho Fiscal da República, que será uma instância de poder que reunirá o
presidente da República, os presidentes do Senado, da Câmara, do Supremo
Tribunal Federal e do Tribunal de Contas da União. Seu objetivo é analisar a
cada trimestre a situação financeira dos entes federativos.
Antes dos projetos serem entregues, o Governo
já sinalizou a alguns interlocutores que gostaria de que as medidas fossem
aprovadas com celeridade, mas, por conta de sua complexidade e da falta de
articulação política com o Legislativo, a tendência é que levem ao menos um ano
para serem votadas nas duas casas. A avaliação foi feita em caráter reservado
por quatro parlamentares ouvidos pela reportagem e por aliados dos presidentes
da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre
(DEM-AP).
Um dos que se manifestou abertamente sobre o
pacote foi o presidente da Comissão Mista de Orçamento, o senador Marcelo
Castro (MDB-PI). “Veio muita coisa de uma vez só. Parece que tudo estava
acumulado para esperar a Reforma da Previdência”, afirmou. Na opinião dele,
contudo, apesar da complexidade da série de medidas elas são bem-vindas. “O
Brasil precisa de reformas e vejo uma boa vontade por parte do Congresso para
votar essas propostas”.
No pacotão econômico ainda será enviado um
trecho da reforma tributária, que tentará aproveitar os dois projetos que já
estão em tramitação na Câmara e no Senado, e outro que trata da lei das
privatizações. “O Governo estava ausente das discussões sobre as mudanças
tributárias. Já estava na hora de apresentar suas propostas”, ponderou o
senador Castro.
Apesar do otimismo do Governo e entre parte
do Parlamento, a aprovação das medidas sofrerá forte restrição entre os
servidores. A reforma administrativa ainda nem foi enviada e um grupo de
funcionários públicos, os do Banco Central, já iniciou protestos. A expectativa
é que haja outras manifestações nas próximas semanas.
Fonte: El País
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