Decisão
é resposta a uma liminar apresentada no órgão pela defesa do ex-presidente, mas
não tem caráter vinculante
O Comitê de Direitos Humanos da ONU
decidiu, nesta sexta-feira, que o Estado brasileiro deve garantir ao
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva o exercício de todos os
direitos políticos mesmo que na prisão. Isso inclui acesso a membros do seu
partido e à imprensa, e que ele não seja impedido de concorrer nas eleições de
2018 até que todos os recursos judiciais pendentes sejam analisados. A decisão
é uma resposta a um pedido de liminar apresentado pela defesa do ex-presidente
ao órgão em 25 de julho deste ano. Ela não tem, entretanto, caráter vinculante,
ou seja, o Governo brasileiro não é obrigado a cumpri-la.
Em sua decisão, o comitê alega ter
concluído que “os fatos indicam a possibilidade de dano irreparável aos
direitos do autor da ação”, e por isso a exigência de que seja garantido a Lula
o exercício de seus direitos políticos “até que todos os recursos sobre sua
condenação tenham sido completados em procedimentos judiciais imparciais e sua
condenação seja definitiva”.
Lula está preso em Curitiba desde
o início de abril cumprindo pena de 12 anos e 1 mês por corrupção e lavagem de
dinheiro no caso do tríplex no Guarujá no âmbito da operação Lava
Jato, e deve ficar inelegível pela Lei da Ficha Limpa. O ex-presidente nega ter
cometido qualquer irregularidade.
A decisão do comitê da ONU, assinada por
dois especialistas da comissão de direitos humanos da organização, Sarah
Cleveland e Olivier de Frouville, destaca que “nenhuma decisão foi tomada pelo
comitê sobre a substância do tema considerado”. A decisão pede ainda que, para
evitar danos maiores que não poderão ser reparados posteriormente, medidas
sejam tomadas pelo Governo brasileiro. A decisão não precisa ser
obrigatoriamente cumprida pelos órgãos brasileiros. No entanto, ela causa
constrangimentos ao país e dá mais fôlego para o discurso petista de que seus
direitos políticos estão sendo violados. Lula foi registrado como candidato à
Presidência no último dia 15 e sua campanha pede para que ele possa participar
dos debates e das sabatinas e entrevistas que estão sendo feitas com os
presidenciáveis.
“Essa é uma decisão muito bem-vinda que
demonstra como os direitos humanos podem auxiliar no processo democrático. Lula
foi condenado por um juiz hostil no que foi, na minha visão, uma acusação
espúria. Ele tem sido mantido em um confinamento virtualmente solitário para
que não pudesse fazer campanha e possivelmente seria desqualificado para
concorrer com base nessa condenação antes que pudesse vê-la revogada em uma
decisão final”, disse o advogado Geoffrey Robertson, responsável pelas ações de
Lula na ONU e em fóruns internacionais.
A defesa de Lula afirmou ainda, em nota,
que a "decisão reconhece a existência de violação ao artigo 25 do Pacto de
Direitos Civis da ONU e a ocorrência de danos irreparáveis a Lula na tentativa
de impedi-lo de concorrer nas eleições presidenciais ou de negar-lhe acesso
irrestrito à imprensa ou a membros de sua coligação política durante a
campanha", ressaltou o texto. Os defensores afirmam ainda que no decreto
legislativo número 311 de 2009, o Brasil incorporou ao "ordenamento
jurídico pátrio o Protocolo Facultativo que reconhece a jurisdição do Comitê de
Direitos Humanos da ONU e a obrigatoriedade de suas decisões."
"Diante dessa nova decisão, nenhum órgão do Estado Brasileiro poderá
apresentar qualquer obstáculo para que o ex-presidente possa concorrer nas
eleições presidenciais de 2018 até a existência de decisão transitada em
julgado em um processo justo, assim como será necessário franquear a ele acesso
irrestrito à imprensa e aos membros de sua coligação política durante a
campanha", concluiu a nota.
O Ministério de Relações Exteriores afirma,
também em nota, que as conclusões do comitê têm caráter de recomendação e não
possuem efeito juridicamente vinculante e que o teor da deliberação do Comitê
será encaminhado ao Poder Judiciário. Diz ainda que a Delegação Permanente do
Brasil em Genebra tomou conhecimento, sem qualquer aviso ou pedido de
informação prévios. "O Comitê, órgão de supervisão do Pacto de Direitos
Civis e Políticos, é integrado não por países, mas por peritos que exercem a
função em sua capacidade pessoal", pondera. "O Brasil é fiel
cumpridor do Pacto de Direitos Civis e Políticos. Os princípios nele inscritos
de igualdade diante da lei, de respeito ao devido processo legal e de direito à
ampla defesa e ao contraditório são também princípios constitucionais
brasileiros, implementados com zelo e absoluta independência pelo Poder
Judiciário.
Fonte: El
País
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