Nova lei do trabalho foi eficiente em reduzir as queixas contra
empregadores, mas emperrou acordos coletivos e esbarrou em forte resistência de
sindicatos e entidades.
A reforma
trabalhista completa neste domingo (11) um ano de sua entrada em
vigor tendo mudado pontos importantes das relações de trabalho – mas esbarrado
em forte resistência e gerou temores de insegurança jurídica. A nova lei entrou em vigor em 11 de novembro de
2017.
Com 54 artigos alterados, 9
revogados e 43 criados, a reforma modificou cerca de 10% da legislação
trabalhista – que desde a sua criação, em 1943, já sofreu uma série de
adaptações.
A expectativa do governo era de
que a reforma gerasse empregos formais e reduzisse a informalidade. O
desemprego de fato caiu este ano, mas ancorado principalmente no aumento do
trabalho sem registro.
As vagas de trabalho intermitente
e as demissões por acordo mútuo, duas das grandes novidades da nova lei,
viraram realidade, mas as adesões ficaram abaixo do que se esperava.
"A reforma melhorou a
dinâmica das relações do trabalho, mas ela, por si, não é capaz de criar
empregos”, avaliou o professor de relações do trabalho da Fea/Usp, Hélio
Zilberstajn, em evento sobre o aniversário da reforma, na sexta-feira (9).
Nos tribunais, o número de
reclamações trabalhistas caiu drasticamente, assim como os pedidos de danos
morais. “Isso não quer dizer que o conflito de interesses entre patrão e
empregado desapareceu. Na verdade, os abusos ficaram mais contidos”, observou
Zilberstajn.
Acordos coletivos travaram no
primeiro semestre, diante do impasse do fim
da obrigatoriedade da contribuição sindical, que derrubou a arrecadação
dos sindicatos em 86%. A constitucionalidade da mudança chegou ao Supremo
Tribunal Federal (STF), que confirmou o caráter opcional do pagamento pelo
trabalhador.
12 mudanças na lei trabalhista
Outro ponto que gerou insegurança
no meio jurídico foi se a reforma valeria também para os contratos de trabalho
antigos, celebrados antes da mudança. Ministros do Tribunal Superior do
Trabalho (TST) entenderam que só os novos contratos devem ser submetidos à
reforma.
Veja abaixo os principais efeitos da
reforma trabalhista após 1 ano:
1.
Queixas trabalhistas despencam
Como era: A lei
não previa que o trabalhador pudesse pagar os honorários do advogado da parte
vencedora, caso perdesse a ação. Também não havia multa por possível má-fé e
custas por faltar nas audiências.
O que diz a nova lei: O
trabalhador que faltar a audiências ou perder a ação tem de pagar custas do
processo e o valor devido ao advogado da empresa. Se o juiz entender que ele
agiu de má-fé, há multa e pagamento de indenização.
O que aconteceu: Desde
dezembro do ano passado, o número de processos novos nas Varas do Trabalho tem
sido inferior ao de todos os meses entre janeiro a novembro de 2017. A
quantidade de ações trabalhistas abertas de janeiro a agosto de 2018 ficou, em
média, 36,5% abaixo do mesmo período de 2017, segundo o Tribunal Superior do
Trabalho (TST).
Na prática, o processo ficou mais
caro para o empregado e inibiu as queixas. “As ações que foram efetivamente
apresentadas após a reforma foram feitas com maior cuidado e menos pedidos
aventureiros, o que levou a um aumento de decisões procedentes em 90%, disse a
gerente executiva de relações do trabalho da CNI, Sylvia Lorena em evento sobre
a reforma, na sexta-feira (9).
2.
Demissão por acordo tem baixa adesão
Como era: Não
existia. Antes, da reforma, só podia sacar o FGTS depositado pelo empregador e
os 40% da multa rescisória em cima do valor quem fosse mandado embora sem justa
causa. Em relação ao aviso prévio, a empresa pode comunicar o trabalhador sobre
a demissão com 30 dias de antecedência ou pagar o salário referente ao mês sem
que o funcionário precise trabalhar.
O que diz a nova lei: Passou
a ser possível fazer acordo na rescisão de contrato, com pagamento de metade do
aviso prévio e da multa de 40% sobre o FGTS. O empregado poderá ainda
movimentar até 80% do valor depositado na conta do FGTS. No entanto, não terá
direito ao seguro-desemprego. Entenda
O que aconteceu: Em
11 meses, houve 125.621 desligamentos negociados em comum acordo no país,
envolvendo 108.687 estabelecimentos, em um universo de 107.885 empresas,
segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). O levantamento
contempla o período de novembro de 2017, quando a nova lei entrou em vigor, a
setembro deste ano.
A maioria dos trabalhadores
desligados por essa modalidade são homens com mais de 30 anos e com carteira
assinada no setor de serviços, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego
(MTE).
O número de acordos oscilou
bastante ao longo dos meses e ainda representa menos de 2% dos desligamentos
feitos no país a cada mês. Em setembro, foram 13.019 demissões por acordo, uma
queda de 13% frente aos 15.010 de agosto. Já em fevereiro chegou a 17.614.
3. Pedidos por dano moral caem
Como era: Não existia
um limite para o valor que um empregado podia pedir como indenização por danos
morais por parte de seu empregador.
O que diz a lei: Com a
reforma, o valor dos pedidos de indenização por danos morais passou a ser de no
máximo 50 vezes o último salário do trabalhador. Além disso, se o juiz entender
que houve má fé, o autor da ação pode ser multado em 10% do valor da causa.
O que aconteceu: Logo
após o início da reforma, o número de pedidos relacionados a danos morais
despencou, segundo dados fornecidos pelo TST ao G1.
No primeiro mês da nova lei, os pedidos somaram 81.507 casos. Já no mês
seguinte, as ocorrências caíram para 15.596.
Entre janeiro e setembro deste
ano, o número de novas ações trabalhistas com pedidos de danos morais caiu 60%
em relação à média de pedidos no mesmo período de 2017, passando de 68.196
casos para 27.122 casos, segundo dados do TST.
4.
Trabalho intermitente não chega a 7% das vagas criadas
Como era: A
lei trabalhista não previa o regime de trabalho intermitente (por período, sem
regularidade).
O que diz a lei: O
trabalho intermitente é pago por período trabalhado. O empregador só convoca o
trabalhador quando há serviço. Ele pode ficar dias, semanas e até meses em
casa, e vai receber todos os benefícios proporcionais ao tempo trabalhado. O
trabalhador recebe por hora, que não poderá ser inferior ao mínimo nem ao dos
profissionais que exerçam a mesma função na empresa.
O que aconteceu: Até
agora, as contratações nesta modalidade estão bem abaixo da expectativa do
governo de criar 2 milhões de empregos em 3 anos, ou 55 mil vagas por mês.
Passados 3 meses da nova lei, a oferta de vagas de trabalho intermitente teve
adesão de poucas empresas, a maioria no comércio.
De novembro de 2017, quando a
reforma entrou em vigor, até setembro de 2018, foram
criadas 47,1 mil vagas nesta modalidade. Neste período, foram fechados
11,2 mil postos intermitentes, gerando um saldo
de 35 mil empregos.
No acumulado do ano até setembro,
o número de postos intermitentes gerados representa 6,5% do total de vagas
criadas no país (719.089).
“Esse tipo de contrato não é para
ser regra. Ele foi criado para acolher o trabalhador que já estava no mercado
mas sem proteção da lei”, observou a gerente executiva de relações do trabalho
da CNI, Sylvia Lorena.
Para a economista da Tendências
Consultoria, Alessandra Ribeiro, a criação de vagas neste tipo de contrato não
tem sido suficiente porque ainda existem incertezas que precisam ser
esclarecidas para as empresas contratarem mais nessa modalidade.
Em setembro, 75% dos postos
criados neste tipo de contrato eram de funções com nível de ensino médio, 15,8%
de ensino fundamental e 9,1% de nível superior. As ocupações de vigilante,
servente de obras, soldador atendente de lojas e garçom lideraram as
contratações.
5.
Arrecadação sindical cai 86%
Como era: O
recolhimento da contribuição aos sindicatos pelo trabalhador formal era
obrigatório e descontado da folha de pagamento. A contribuição equivale ao
salário de um dia de trabalho, retirado anualmente na remuneração do empregado
para manutenção do sindicato de sua categoria.
O que diz a nova lei: O
pagamento da contribuição sindical, que equivale a um dia de trabalho, não é
mais obrigatório. Se optar por fazer a contribuição, precisa informar que
autoriza expressamente a cobrança. A empresa só pode fazer o desconto com a sua
permissão.
O que aconteceu: Dados do
Ministério do Trabalho enviados ao G1mostram que a
arrecadação sindical (somando centrais, confederações, federações e sindicatos)
no acumulado de 2018 até setembro, a arrecadação da contribuição sindical
despencou 86% em relação ao mesmo período do ano passado, passando de R$ 1,9
bilhão para R$ 276 milhões.
Desde o fim de 2017, sindicatos
recorrem à Justiça para tentar manter a cobrança, mas a maioria das ações tem
sido rejeitada no TST.
Em julho, o Supremo Tribunal
Federal (STF) negou os pedidos
para tornar novamente obrigatório o pagamento da contribuição
sindical pelos trabalhadores. A Corte analisou 19 ações de entidades sindicais
contra a regra da reforma trabalhista que tornou o repasse facultativo, em que
cabe ao trabalhador autorizar o desconto na remuneração.
Apesar da queda na arrecadação, o
número de sindicatos no país teve um ligeiro crescimento no mesmo período,
passando de 16.517 em 2017 para 16.663 este ano, segundo o Ministério do
Trabalho.
“Os sindicatos estão fazendo
arranjos, como oferecer serviços de seguro saúde como um jeitinho para garantir
a sobrevivência”, disse o professor da Fipe, Hélio Zilberstajn.
6.
Negociações travam acordos coletivos
O que diz a nova lei: Uma
das maiores novidades da nova lei é que os acordos coletivos podem prevalecer
sobre o que determina a lei em alguns pontos. Isso trouxe mudanças importantes,
mas tem gerado resistência por parte de sindicatos patronais e empregados.
O que aconteceu: Com o fim
da contribuição sindical obrigatória e novas regras para jornada e férias,
muitos acordos (celebrados entre empresa e sindicato) e convenções coletivas
(que abrangem categorias de trabalhadores) ficaram emperrados no primeiro
semestre.
Na prática, o fluxo de
negociações concluídas em 2018 começou a avançar no início do segundo semestre,
mas ainda é menor que no mesmo período de 2017 em 28,6%, segundo dados do
Salariometro.
“A grande dificuldade para fechar
as negociações foi o fim da obrigatoriedade da contribuição sindical”, explicou
Zylberstajn. “Os sindicatos não estavam preparados e tentaram colocar essa
questão nas convenções para manter o status quo”.
As contribuições para sindicatos
de trabalhadores estiveram presentes
em 40,7% das negociações coletivas no ano até agosto, mostrou a
nova base de dados do Salariômetro, boletim de informações trabalhistas da
Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).
7.
Reforma não gera os empregos esperados
Situação anterior: A taxa
de desemprego encontrava-se no patamar de 12% em novembro do ano passado,
quando a nova lei trabalhista passou a valer.
Expectativa: O
então ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, estimou em outubro do ano
passado que a reforma trabalhista tornaria viável a geração de mais de seis
milhões de empregos no Brasil.
Situação
atual: A
taxa de desemprego no Brasil caiu para 11,9% no
trimestre encerrado em setembro, mas ainda atinge 12,5 milhões de brasileiros,
segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Foi a sexta
queda mensal seguida e trata-se da menor taxa de desemprego registrada no ano. Apesar
da queda, o nível de desemprego voltou ao mesmo patamar do período pré-reforma,
quando a taxa estava em 11,8% no trimestre encerrado em novembro de 2017.
De janeiro a setembro, foram criados 719.089 postos de trabalho
formal em todo o país, segundo dados do Caged (Cadastro Geral de
Empregados e Desempregados). “A reforma melhorou a dinâmica das relações do
trabalho, mas ela por si não cria empregos”, afirma Zilberstajn.
Alessandra Ribeiro, economista da
Tendências Consultoria, observou que a recuperação do emprego deve seguir uma
dinâmica gradual, seguindo o lento ritmo de retomada da economia.
8.
Correção de distorções não vingou
O que diz a MP: A
medida provisória pretendia corrigir distorções da nova lei trabalhista. Ela
questionava pontos da lei que criavam insegurança jurídica e eram considerados
inconstitucionais por juristas. A MP criava regras complementaras para pontos
relacionados ao trabalho intermitente, de gestantes e lactantes em locais
insalubres, de autônomos, além de regras para jornada de 12 horas de trabalho
seguidas de 36 horas de descanso.
O que aconteceu: A MP perdeu a validade sem ser votada,
fazendo com que as mudanças já aplicadas definidas na MP deixassem de valer. O
imbróglio jurídico sobre as regras criadas pela MP e que deixaram de valer
permanece.
Por Taís Laporta, G1
Nenhum comentário:
Postar um comentário