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sexta-feira, 1 de novembro de 2019

Alta do nível do mar pode afetar mais de 1 milhão de brasileiros

Centro histórico de São Luís é um dos locais que pode ser afetado pelo avanço do mar.

Centro histórico é um dos locais que pode ser afetado pelo avanço do mar (Foto: Rubens Chaves/Folhapress)

Projeções indicam que, até 2050, as terras onde hoje vivem 1,4 milhão de brasileiros sofrerão riscos de inundações anuais, e 1 milhão de pessoas do país vivem em locais que poderão ficar permanentemente submersos com o aumento do nível do mar.

A conclusão foi publicada na prestigiosa revista científica Nature Communications nesta terça (29). O estudo aponta que a alta do nível do mar fará com que, até 2050, locais em que vivem pelo menos 300 milhões de pessoas em todo o mundo estarão sob risco de inundações crônicas. Até 2100, as terras que abrigam cerca de 200 milhões de pessoas podem ser permanentemente submersas.

A estimativa foi feita por meio da plataforma Coastal Risk Screening Tool (Ferramenta de Rastreio de Risco Costeiro, em português), do Climate Central —uma ONG de pesquisadores e jornalistas dedicados a estudar as mudanças climáticas.

Scott Kulp, principal autor do estudo e cientista do Climate Central, afirmou que as mudanças climáticas têm o potencial de remodelar cidades, economias, litorais e regiões globais inteiras durante a nossa vida. “O Brasil e outras nações costeiras só terão tempo suficiente para planejar e construir sistemas de proteção caso a velocidade de elevação do nível do mar seja reduzida pela redução de emissão de gases do efeito estufa”, disse.

José Marengo, coordenador-geral de pesquisa do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), em São José dos Campos (SP), e que não esteve envolvido no estudo, afirma que muitas áreas do país já estão vulneráveis.

“Em Santos, por exemplo, a prefeitura comprou casas e realocou pessoas. A vulnerabilidade existe. No futuro, com todas essas projeções, se houver constância no combate às emissões de gases do efeito estufa, o risco será menor”, diz.

Marengo e colegas estudaram, entre 2013 e 2017, os impactos das mudanças climáticas em três cidades costeiras: Santos (SP), Broward, na Flórida (EUA), e Selsey, no Reino Unido.

Os resultados apontaram que dois bairros da cidade paulista — um mais rico e turístico e o outro mais pobre —são igualmente vulneráveis a eventos extremos oriundos das mudanças climáticas, como as fortes ressacas, que são cada vez mais comuns e provocam danos à infraestrutura pública e privada.

Mas, segundo Marengo, o Brasil tem poucas instalações capazes de fazer medições do nível do mar apesar de o país ter um extenso litoral e muitas áreas de risco. Sem dados, avaliar a vulnerabilidade do país torna-se uma missão quase impossível.

Outros países sob grande risco de inundações são China, Bangladesh, Índia, Vietnã, Indonésia e Tailândia. Mais de dois terços da população sob risco estão nesses países.

Tempestades destrutivas alimentadas por ciclones cada vez mais poderosos e a elevação do nível dos mares atingirão a Ásia com mais força, segundo o estudo.

A pesquisa refez as projeções para 2050 usando inteligência artificial para corrigir dados de elevação do solo. O problema é que os dados da Missão Topográfica Radar Shuttle (SRTM), fornecidos gratuitamente pela Nasa, confundiam telhados e árvores com o nível do solo.

“As projeções do nível do mar não mudaram, mas, quando usamos nossos novos dados de elevação, encontramos muito mais pessoas vivendo em áreas vulneráveis do que anteriormente”, disse Ben Strauss, cientista-chefe e diretor do Climate Central e coautor da pesquisa.

Vários fatores contribuem para ameaçar populações que vivem a poucos metros do nível do mar, como a expansão da água à medida que o clima aquece, o derretimento de camadas de gelo da Groenlândia e da Antártida e as tempestades tropicais —tufões, ciclones ou furacões — amplificadas por uma atmosfera quente.

As grandes tempestades que até recentemente ocorriam uma vez por século, por volta de 2050 acontecerão em média uma vez por ano em muitos lugares, especialmente nos trópicos, segundo o relatório do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU).

“Não é preciso um grande aumento no nível do mar para que problemas catastróficos ocorram”, disse Bruce Glavovic, professor da Universidade Massey, na Nova Zelândia, que não participou do estudo.

Em agosto deste ano, a geleira Okjökull, na Islândia, teve seu fim e até uma espécie de velório organizado por cientistas. Segundo projeções, nos próximos 200 anos todas as geleiras da Islândia devem ter o mesmo destino.

Desde 2006, o nível do mar subiu 3,6 mm por ano. Nesse ritmo, até 2100 o mar terá subido mais de 1 metro, invadindo áreas costeiras e desabrigando populações.

Se o aquecimento global ficar abaixo de 2°C, o nível do mar deverá subir cerca de meio metro até 2100. Nas taxas atuais de poluição de carbono, no entanto, o aumento será quase o dobro.

Com a previsão de que a população global aumentará dois bilhões até 2050 e mais um bilhão até 2100  —principalmente em megacidades costeiras —, mais pessoas serão forçadas a se adaptar ou a sair das zonas de perigo.

“O aquecimento vai continuar, mas se houver diminuição do desmatamento e das emissões de gases-estufa, o ritmo pode diminuir e os impactos serão menores”, diz o pesquisador José Marengo.

Jean-Pascal van Ypersele, professor de climatologia da Universidade Católica de Louvain da Bélgica e ex-vice-presidente do IPCC, disse que o novo método representa “um progresso muito significativo” na compreensão dos riscos decorrentes do aumento do mar.

Fonte: Jornal Pequeno

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